noticia estranha.... muito estranha e JOSÉ LUIS CARDOSO APRESENTA C FURTADO
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23 de setembro de 2024, 11:27 hAtualizado em 23 de setembro de 2024, 11:41 h
Capítulo XIII
Celso Furtado e as encruzilhadas
do desenvolvimento
1
José Luís Cardoso
2
C
elso Furtado (1920-2004) pode e deve ser considerado, sem
exagero nem controvérsia, como o mais importante economista
brasileiro de todos os tempos. As suas contribuições originais, no do-
mínio da economia e política do desenvolvimento, fazem dele uma fgura
marcante da história do pensamento económico da segunda metade do
século XX. Ultrapassou em larga escala o âmbito brasileiro e latino-a-
mericano das suas motivações intelectuais e políticas, sendo hoje re-
conhecido como autor relevante nas áreas em que prestou contributos
metodológicos e analíticos de caráter inovador.
Apesar do merecido reconhecimento de que tem sido alvo, a projeção
de Celso Furtado na cena internacional foi certamente prejudicada pela
menor divulgação da sua obra em língua inglesa. É certo que alguns dos
seus livros e ensaios foram traduzidos em inglês, sendo também abun-
dantes as traduções em espanhol, francês e italiano. Porém, a repercussão
dos seus escritos nos círculos e circuitos internacionais de produção e
difusão de pensamento econômico não terá sido tão ampla como seria
1 Publicada, originalmente, em Análise Social, 2015, Vol. L, nº 214, pp. 26-4, e republi-
cada nesta Coletânea com a autorização da Revista e do autor.
2 É investigador coordenador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de
Lisboa. Publicou vários artigos em periódicos referenciados pelo ISI e Scopus, coor-
denou a Coleção Obras Clássicas do Pensamento Econômico Português e foi co-fun-
dador da revista The European Journal of the History of Economic e é sócio efetivo da
Academia de Ciências de Lisboa.
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de desejar.
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O alcance inovador das suas contribuições mereceria maior
destaque.
Para além do obstáculo linguístico, outro fator que poderá ajudar a
explicar a menor assimilação e o reduzido impacto internacional da obra
de Furtado, na perspectiva da formação dos cânones da ciência econó-
mica contemporânea, reside, precisamente, na menor pertinência ca-
nônica dos seus textos, aforando e discutindo matérias habitualmente
cunhadas de heterodoxas ou marginais em relação à visão dominante na
análise de temas relacionados com o crescimento e o desenvolvimento
econômico.
Esta dupla explicação não serve para impugnar a atualidade e rele-
vância dos temas que privilegiou ao longo da sua carreira, conforme fca
demonstrado em alguns recentes ensaios que têm procurado enquadrar
e valorizar os seus contributos numa perspectiva cosmopolita e uni-
versal (SZMRECSÁNYI, 2005 e BOIANOVSKY, 2010). Aliás, é justamente
a atualidade e relevância dos temas da agenda de investigação de Celso
Furtado que justifcam a atenção que continuam a suscitar sempre que
se discutem os problemas do desenvolvimento econômico no mundo
contemporâneo.
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Um dos principais méritos de Furtado terá sido o de não assumir a
pose de um economista monolítico e convencional. A sua vocação po-
lítica e o seu compromisso cultural obrigaram-no a atravessar domínios
amplos de conhecimento e a desafar as regras redutoras do saber fechado
e compartimentado. Cruzou uma diversidade de ciências sociais, mos-
trando que a ciência econômica não pode fcar alheia, nem ignorar, as
contribuições de outros domínios científcos que alargam e enriquecem
a compreensão da realidade econômica e social. E, para o que nos inte-
ressa aqui discutir e salientar, possibilitou a difusão e apropriação da sua
obra em território português, assumindo inesperadamente o estatuto
de inspirador e mentor de estratégias de desenvolvimento num país que
pertencia a uma outra periferia. Numa encruzilhada tecida entre dois
lados do Atlântico, o testemunho de Celso Furtado permite ilustrar a im-
portância que os países sempre atribuem à defnição de trajetórias de de-
senvolvimento, independentemente do nível ou patamar que já tenham
alcançado.
Procurando respeitar o âmbito em que este texto foi inicialmente apre-
sentado, destacarei aspetos da obra de Celso Furtado que creio relevantes
para o aprofundamento do diálogo entre cientistas sociais portugueses e
brasileiros. Não pretendo explorar ou focar tópicos já amplamente deba-
tidos por especialistas da sua obra centrada nas temáticas das teorias e
políticas de desenvolvimento econômico. Após recordar alguns registos
cruciais do percurso biográfco de Celso Furtado, procurarei sintetica-
mente abordar dois momentos da sua carreira – a publicação e impacto
público do seu livro Formação Econômica do Brasil (1959) e a sua expe-
riência como doutrinador e executante de políticas desenvolvimentistas
– que creio particularmente relevantes para a compreensão do tema aqui
em destaque: a infuência da sua obra em cientistas sociais portugueses,
sobretudo em autores que gravitavam na órbita da revista Análise Social e
do Gabinete de Investigações Sociais (atual Instituto de Ciências Sociais
da Universidade de Lisboa).
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