ELASDIC MAIO 2023 - BRASIL / REFORMA DO ESTADO
Brasil, Reforma do Estado. 1988 / 2021
Roteiro de palestra no evento XVI ELADISC. ENCONTRO
LATINO-AMERICANO DE DIREITO, SOCIEDADE E CULTURA.
UFF / Niterói-RJ, 11-05-2023
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Prof. Ceci Juruá – Economista, mestre em Desenvolvimento e Planejamento Econômico, doutora em Políticas Públicas, foi professora de Economia na Universidade Católica de Brasilia, servidora do Estado até 1998, aposentada pela Companhia do Metropolitano do RJ.
1.-Dois fatos marcam o início (ideológico e político) da Reforma do Estado, no Brasil. Primeiramente, destaco a extinção dos impostos únicos, base financeira do Estado brasileiro desde 1940. Os quatro impostos únicos que permitiram e viabilizaram financeiramente a montagem de um Estado desenvolvimentista no Brasil incidiam sobre petróleo e lubrificantes líquidos e gasosos, energia elétrica, minerais e telecomunicações. Foram cancelados, considerados desnecessários durante a elaboração da Constituição de 1988. Em segundo lugar, deve-se dar o devido destaque à Conferência que resultou na elaboração do Consenso de Washington (1989) nos Estados Unidos, com a participação de lideranças políticas e intelectuais de vários países da América Latina, inclusive do Brasil.
2.-O Consenso de Washington destacou dez pontos/ “mandamentos” a serem observados pelos governos dos países latino-americanos : disciplina fiscal, redução dos gastos públicos, reforma tributária, juros de mercado, taxa de câmbio do mercado, abertura comercial, investimento estrangeiro direto sem restrições, privatização das estatais, desregulamentação generalizada, direito à propriedade...
Em artigo publicado na revista Pesquisa e Planejamento Econômico (número de abril de 1991) o professor Luis Carlos Bresser Pereira vinculou o Consenso de Washington à crise fiscal dos estados latino-americanos nos anos 1980. Explicou ainda que a crise fiscal dos países latino-americanos tem 5 ingredientes principais: excessiva dívida pública interna e externa , déficits públicos, dimensões insignificantes da poupança pública (negativa na maioria das vezes), falta de crédito do Estado e falta de credibilidade dos governos.
3.-O primeiro ato efetivo conferindo legitimidade política à Reforma do Estado no Brasil veio da parte do presidente Fernando Collor de Melo. Lançado por meio de medida provisória (MP 155/1990) o primeiro Programa Nacional de Desestatização foi tornado público em 12 de abril de 1990 através da Lei 8031/1990 (lei ordinária). Além do presidente da República, este ato foi assinado pela dupla Bernardo Cabral e Zélia Cardoso de Mello.
Decorridos sete anos de vigência da Lei 8031, repetidamente alterada por muitas medidas provisórias, o sucessor de Collor - presidente Fernando Henrique Cardoso - encaminhou pedido de alteração por medida provisória (MP 1481-52). Em seguida, esta MP deu origem à Lei 9491 de 09-setembro-1997 que instituiu um segundo Programa Nacional de Desestatização.
Rodolfo F. Alves Pena captou o verdadeiro sentido do Consenso ao afirmar que seu receituário tornou-se ...“uma verdadeira receita de bolo para a execução das premissas liberais em toda a região latino- americana... Grupos e movimentos estatistas e de esquerda orientam frequentes críticas ao Consenso.... [e] apontam que a solução para os países do sul seria adotar uma política inversa à preconizada em Washington...” (Acesso em 12.10.2020. Disponível em : https://brasilescola.uol.com.br/geografia/consenso-washington.htm)
4.-Há extensa bibliografia sobre o Consenso de Washington, as Reformas ou a Reforma do Estado no Brasil e o Neoliberalismo praticado até hoje em vários de nossos países sul-americano seguidores da diretriz imperial ‘TINA’ ( ‘there is no alternative’).
Pessoalmente tenho preferência por François Chesnais (um dos livros mais conhecidos desse autor tem por título, no Brasil, “Mundialização do Capital”.) Dentre os franceses cito também André Orléans e Alain Badiou. De A. Badiou vale registrar a afirmação que segue:
“Sobre o futuro, temos hoje todas as incertezas que cercavam Lenine em 1902. Mas não discutimos mais o totalitarismo comunista ou esquerdista. As verdadeiras ameaças estão aqui, no conflito entre democracia e capitalismo.”
Quando interrogado sobre a possibilidade de se usufruir de ares democráticos em sociedades sob o jugo do capitalismo financeirizado Badiou respondeu:”NÃO – O Capital é o grande Outro da democracia, esta se torna submissa na própria essência.”
Em síntese, para Badiou voltamos “à época de um capitalismo movido por uma lógica imperial planetária”
Merece ainda citação o livro do jornalista Newton Carlos CAMELOT, UMA GUERRA AMERICANA (Ed. Objetiva, 1991)obra que apresenta na Introdução a doutrina Bissel, formulada por R. Bissel, membro do setor de planejamento da cia, professor de Yale e de Massachussets, e de outros órgãos de informação, formação e mídia, caso da Fundação Ford.
Aproveitando a brecha do presidente norte-americano anterior a Kennedy, que havia autorizado “ações limitadas” contra regimes mal vistos (Cuba,por exemplo), Bissel sugeriu que esse tipo de operação, clandestina, seria de fácil implantação no terceiro mundo, onde os governos são geralmente fracos. Mas, para evitar conflitos locais, nos USA, o ideal seria que contratos dessa natureza fossem firmados com naturais do próprio país objeto da intervenção.
Há também em CAMELOT, UMA GUERRA AMERICANA, a informação de que já houve casos em que tais pagamentos foram feitos diretamente a pessoas ligadas aos governantes, ou ao próprio chefe do governo. (!) No Brasil atual, comenta-se que talvez haja, aqui entre nós, cerca de 11 mil pessoas vigiadas por fbi ou cia, às vezes em razão de um simples posicionamento anti-norteamericano.
5.-Na Economia, em fim, merece citação livro do prof.Xavier Greffe, COMPRENDRE LA POLITIQUE ECONOMIQUE (Ed.Economica, Paris/ 1999). Segundo esta obra, a virada radical partiu do grupo de economistas que esteve à frente da crítica às políticas keynesianas. . Afirmaram que a retomada do crescimento econômico deveria exigir o fim da intervenção estatal em matéria de sustentação da Demanda e defenderam, ao mesmo tempo, a liberação imediata da Oferta. Surgiu assim a teoria da SUPPLY ECONOMICS (Economia da Oferta).
A NOVA POLÍTICA ECONÔMICA, base do neoliberalismo, passou a ter como princípios básicos uma quádrupla redução: da despesa, dos impostos, da regulamentação e da massa monetária. Seus autores diziam que estas práticas fariam surgir um círculo virtuoso decorrente da diminuição da parte do Estado na economia, viabilizando assim maior rentabilidade dos investimentos privados e a retomada do crescimento econômico.
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Em conclusão :
Com a Lei Complementar 179 (agosto 2021) afirmando (sem base conceitual nem política) que o Banco Central deveria gozar de ampla liberdade e autonomia, o governo da República brasileira perdeu importante instrumento de intervenção na economia e de estímulo ao crescimento. No governo Collor já havia perdido o instrumento da taxa de câmbio que foi, então, entregue às forças do mercado mundial, isto é as Altas Finanças da Mundialização. Também a política salarial escapa atualmente à regulamentação governamental...
Podemos supor, agora, que a vitória coube às forças que propuseram nos anos 1990 o fim da Era Vargas. Em 2021 foi colocada uma lápide com a inscrição JÁ ERA!, durante a gestão do inominável !
ADENDO FINAL :
------ Se quisermos sobreviver enquanto nação e preservar íntegro o território legado pela nação irmã, Portugal, será necessário promover o Renascimento de um ESTADO NACIONAL DESENVOLVIMENTISTA 100 % brasileiro, evitando assim o destino trágico imposto à China e à India em tempos do império britânico, século XVIII>
_________ CJ, RJ, 11 de maio de 2023.
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