Comemorações inconclusas do Bicentenário,
faltam Nordeste e Amazônia.
Por Ceci Juruá* (fev. 2023)
Em agosto de 1822, o então Príncipe Regente, D. Pedro, deixou o Rio e foi a São Paulo resolver questões políticas daquela província. Em sua ausência, atracou no Rio de Janeiro o navio português Três Corações, trazendo ordens emitidas pelas Côrtes de Lisboa a respeito do Brasil. Entre tais ordens, teve repercussão altamente desfavorável a decisão de mandar instalar juntas de governo subordinadas a Lisboa nas províncias brasileiras, pois tratava-se de medida que limitaria, necessariamente a autoridade do Principe Regente.
D, Pedro, ao tomar conhecimento desse fato, e das opiniões de José Bonifácio e da Imperatriz Leopoldina transmitidas por cartas que lhe foram entregues na ocasião, proclamou ali, às margens do arroio Ipiranga (São Paulo) , em 7 de setembro de 1822, o brado simbólico : Independência ou morte. Não se tratou de gesto impulsivo, pois na Côrte do Rio de Janeiro a opinião corrente já considerava a independência um fato consumado, desde a convocação da Assembléia Constituinte, em 3 de junho, ou, pelo menos, desde o decreto do dia 1º de agosto (p.371-372, Dicionário do Brasil Imperial), uma Proclamação que começava com a frase
“Esclarece os Povos do Brazil das causas da guerra travada contra o Governo de Portugal” (sic)
Entre as denúncias contidas na Proclamação aos Povos do Brazil, em 1º de agosto de 1822, figuram graves acusações do tipo : “mãos roubadoras dos recursos aplicados no Banco do Brasil”, e a denúncia de que o Congresso de Lisboa “negociava com Nações estranhas a alienação de porções do território brasileiro, visando enfraquecer e escravizar”.
Por outro lado, Gonçalves Ledo, de quem pouco se fala atualmente, apresentou moção em 9 de setembro, em sessão extraordinária do Grande Oriente do Brasil, para a organização de uma cerimônia traduzindo o rompimento total e definitivo com a antiga metrópole... Daí a Aclamação de D. Pedro “pela graça dos povos e de Deus”, enquanto Imperador constitucional do Brasil em 12 de outubro, data do aniversário de 24 anos do Imperador. (idem, p.371-372)
Por ocasião da aclamação do imperador, em outubro de 1822, apenas os estados que hoje constituem as regiões Sul e Sudeste apoiavam a nova organização política, enquanto Pernambuco apenas participara das eleições para a Assembléia Constituinte. Goiás e Mato Grosso juntaram-se ao Império em janeiro de 1823, em seguida foi a vez de Pernambuco, Sergipe e Alagoas.
Em artigo sobre Estado e Política na Independência, a historiadora Lúcia M. Bastos P. Neves, explica a não adesão imediata de uma parte da Bahia, assim como das províncias nordestinas Piauí/Ceará e Maranhão, e do Pará ao Norte. Para ela, o jogo político acabou gerando conflitos entre o centralismo da corte fluminense e um eventual autogoverno provincial.
... "finda a invasão do território português pelas tropas francesas, algumas províncias, como passavam a ser chamadas as capitanias, voltavam a ligar-se diretamente a Lisboa, em função, sobretudo, de seus interesses econômicos e comerciais... acabaram por constituir um grupo bastante homogêneo e poderoso, solidamente enraizado no Centro Sul, cuja atuação seria decisiva na independência, de forma distinta daqueles que habitavam o Norte e o Nordeste, ainda dependentes em muito das casas comerciais portuguesas."
Foi esta dependência comercial, mais a presença de tropas portuguesas nas províncias, que explicam parcialmente as guerras da independência que ocorreram em território da Bahia, nas província nordestinas de Piauí/Ceará e Maranhão, e ao Norte, no Pará. Foram guerras com efusão de sangue, acentua Lúcia Neves. Guerras para expulsar os que se tornaram estrangeiros. Em cada local, foram fixadas datas de comemoração local da independência com adesão ao Império do Brasil e à autoridade de Pedro I.
Piauí/Ceará, 13 de março, após Batalha de Jenipapo
Bahia, 2 de julho, após expulsão das tropas portuguesas que ocupavam Salvador
Maranhão e Pará, 7 e 15 de agosto respectivamente.
Os cinco estados, ex-provincias, que conquistaram guerreiramente o direito de pertencer ao Brasil merecem, neste ano de 2023, uma comemoração à altura do papel que desempenham, ainda hoje, como guardiães da verdadeira cultura brasileira, Uma cultura poderosa, que resiste a séculos de escravidão e de genocídio dos povos originários e nos brindou, em 2022, com heroica vitória eleitoral contra velhos fantasmas nazi-fascistas. Vai ficando claro, para os brasileiros, que a Bahia é o nosso berço nativista,
Nosso povo gosta de festa, de alegria e de liberdade. Quem sabe o governo atual terá disponibilidade para festejar este outro Brasil, ao norte das regiões Sul e Sudeste, o Brasil dos guerreiros humildes que nos legaram um imenso território e a capacidade de sobreviver com dignidade e esperança.
O Centenário de RAUL PREBISCH, por Celso Furtado. Texto N.1
CELSO FURTADO,” EM BUSCA DE NOVO MODELO. Reflexões sobre a crise contemporânea” Cap. VI. O CENTENÁRIO DE RAUL PREBISCH (SP : Editora Paz e Terra, 2002) Texto N.1, selecionado para o ICF/APD * _______Celso Furtado, sobre Prebisch e Cepal* “As Nações Unidas haviam criado a COMISSÃO ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA em começos de 1948, fixando sua sede na capital do Chile, país autor da proposta e que muito se empenhara em sua aprovação. Mas não fora fácil encontrar alguém à altura para dirigir sua secretaria executiva. Nesses primeiros meses estávamos absorvidos em nossas tarefas... Inesperadamente circulou um estudo de natureza teórica preparado por um consultor independente: Raúl Prebisch. Raúl Prebisch chegara à CEPAL em fevereiro de 1949. Criador e diretor geral do Banco Central da Argentina, de 1934 à 1943, ele havia comandado a bem sucedida política de estabilização, particularmente em 1938, e recebera elogios dos mais variados círculos internacionais . Era, sem luga...
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